segunda-feira, 9 de maio de 2011

Difícil começo

Hoje o Ayrton Brum nos traz a continuação da sua história no automobilismo, dando detalhes da montagem do seu primeiro Fusca de corrida, em 1989, as dificuldades enfrentadas e a necessidade de interromper seu sonho. Muito bacana.

"A montagem do 77 foi uma fase muito complicada, a mais dura e cansativa na minha carreira, pois a grana era muito curta, mas o sonho era muito longo.

O meu conhecimento de carro de Corrida era zero, entendia o básico de carro de rua, mas quanto a corridas, era menos que zero.

Embora sonhasse todos os dias com carros de corrida, cometi o erro de nunca procurar me informar e conviver com pessoas envolvidas com corrida. Eu era completamente desinformado em montagem de carro de carro de competição, apenas tinha era muita vontade de correr e achava que isso bastava.

O primeiro passo era comprar um carro. Encontrei uma Fusca de rua de um mecânico chamado Renato, que tinha uma pequena oficina na Av. Érico Veríssimo, quase esquina com a Ipiranga. O nome da oficina era Multi Serviços.

Com o Fusca comprado eu não tinha um carro de passeio para andar na rua, andava de ônibus para poder ir trabalhar, mas o mais importante para mim era ter meu carro de corrida e assim pegava o ônibus e ia procurar alguma oficina que arrumasse o meu carro.

Tinha uns amigos que rebocavam meu carro para levar de oficina em oficina, e "implorar" que preparasse meu carro para que eu pudesse realizar meu sonho, mas com um "pequeno detalhezinho": tinha de ser de graça, pois eu não tinha grana. Cansava de sair do serviço e ir nas oficinas e ao chegar lá, a decepção, o carro estava do mesmo jeito que deixava a dias dias atrás. Tristeza, decepção e raiva era o máximo que conseguia nessas oficinas.

Um dia lembrei do mecânico que me vendeu o carro e fui na oficina dele ver se ele "terminava" meu carro para que eu pudesse correr e ele concordou. Foi o primeiro que estendeu a mão para mim e não me enrolou, apenas me falou que não entendia nada de preparação para corrida. Lembro que comentei com ele: você entende de carro de rua, me serve, vamos lá. Combinamos de depois do expediente dele eu saia do meu serviço e ia na oficina dele e trabalhávamos até a meia noite. Comia um xisburguer, horrível, em pé, em um trailer que tinha na própria Érico Veríssimo. Levava um outro pro meu amigo e começávamos a "mexer" no carro, sempre com o regulamento preso na parede de madeira da oficina.

Muitas vezes um ia ler o regulamento e não entendia, chamava o outro e também não entendia, riamos e fazíamos da maneira que achávamos que era, e lembro que uma
vez ainda comentei com ele: Renato, vamos fazer como entendemos, ninguém é louco, tu achas que vão protestar meu carro e abrir o meu motor??? Assim conseguimos deixar o 77 mais ou menos parecido com carro de corrida. E lá fomos para a primeira corrida, no peito e cheio de orgulho.

Ao chegar, o pessoal olhava meio estranho pro meu carro, não sei se era porque meu carro era o único que tinha forração no teto, ou se era pela minha suspensão, completamente retinha, sem cambagem nenhuma nas rodas dianteiras e a traseira bem alta.

Eu não cheguei a ver, mas eu acho que quando passei na reta na primeira volta com chuva, todo mundo deve ter ido para a mureta ver como eu ia fazer a Curva 1. A minha sorte era que meu motor não empurrava nada, era um motor de rua, piorado.

No sábado, para tomada de tempo, chuva, dia escuro, perfeito para quem era piloto experiente. Não tem nada, vamos lá, eu nem sabia como era o ritual pra entrar na pista para tomada de tempo, não sabia se era por ordem de número do carro, ou inscrição. Resolvi seguir o carro que ia na minha frente e fui... Entrei na pista e a chuva caindo.

Nunca tinha andado na pista de Tarumã, pois o meu curso de pilotagem foi em Guaporé. A parte que se enxerga da arquibancada tudo bem, mas eu não entendia e não sabia como era a pista ali na Curva 9, pois nunca tinha visto ali pelo kartódromo. Esse foi meu primeiro contato com a pista de Tarumã.

Na segunda prova eu não fiz tomada de tempo no sábado, nem fomos para o autódromo, pois tinha coisas para fazer no carro.

Nessa época corria o "Guto Furst", com o Fusca 40 da Parks e quem preparava o carro era o Paulo Ferreira da Mecânica MC na Aparício Borges e o Guto morava na Av. Érico Veríssimo, a uma quadra da oficina onde eu o Renato trabalhávamos no 77.

O Paulinho Ferreira, anos depois, veio a preparar o Speed 11 e foi com quem obtive os melhores resultados e bons resultados também tive com meu outro preparador do Speed 11, que foi o João Mascarelo de Viamão. Esses foram meus dois únicos preparadores.

O Paulinho entrou na oficina umas 9 horas da noite, conversou com a gente, comentou que tinha feito a pole, deu umas dicas para nós e foi embora, dizendo que esperava nos ver no dia seguinte em Tarumã. No dia seguinte lá estava eu, chegando com o carro rebocado pelos amigos e perguntando quem era o último colocado e que eu iria largar atrás dele, pois não tinha feito tempo no sábado.

Assim foram três provas, com um carro completamente torto das porradas que levou na rua.

A minha esposa começo a me cobrar, que morávamos em um apartamento que não estava pago, e que se me acontecesse alguma coisa, ela não iria ficar bem.

Fui na garagem onde guardava o 77 e fiquei olhando para ele, e pensando...putz cara, minha esposa tem razão, vou ter que vender você, mas não cometerei o erro
de comprar um carro de rua todo ruim, vou comprar um carro já pronto, andando, de preferência de ponta.

Resolvi vender o Fusca, coloquei um cartaz no mural da FGA, pedi Cr$ 5.000,00, e pensei que não conseguiria vender por esse preço, um carro sem história no
automobilismo, mas coloquei lá. Em poucos dias apareceu um pessoal de Santa Cruz do Sul que queria para Arrancada, gostaram, e levaram o 77.

Senti como se estivesse vendendo meu próprio filho. Fechei o portão da garagem e não olhei para trás, não quis ver levarem meu filho, feito com tanto
carinho, mas ao mesmo tempo sabia que com ele não conseguiria resultados.

Em 1992 comprei minha casa, onde moro ainda hoje, e disse a minha esposa: pronto, aí está a casa que você queria, está paga, agora vou tratar de voltar a correr... Ela apenas comentou: meu Deus, vai começar tudo de novo... Eu disse: não, agora vai ser diferente, não cometerei os erros que cometi com o 77.

Passei longos dois anos e alguns meses sonhando novamente todos os dias com meu retorno às pistas, mas com uma mentalidade e conhecimento muito diferente.

Olhando os classificados, na parte de Fuscas, em Outubro de 1992, vejo o seguinte anúncio: VENDO FUSCA DE COMPETIÇÃO, SPEED 11, tratar com JOÃO SILVA. Meu Deus, era tudo o que queria encontrar no jornal".

Abaixo alguns registros daquelas três primeiras provas em 89.








Sobre as imagens acima ele ainda lembra de alguns detalhes, como a aquela em que ele está alinhado no grid, pronto para a primeira corrida. A luva foi comprada em uma loja de material esportivo, era de goleiro (!). O macacão foi feito por uma parente e tinha quase o mesmo peso do piloto. O único patrocínio era o da oficina do amigo Renato, a Multi Serviços. Brum ainda lembra do seu pensamento no momento daquela foto: sonho realizado aos 30 anos de idade...

Na foto em que mostra o painel do 77 ele lembra que o painel em que estavam o conta giros e o da pressão de óleo foi feito do fundo de uma lata de thinner, cortado na diagonal.

Na primeira foto em que ele aparece limpado o carro, aparece ao fundo o Fusca amarelo do "Guto Furst" e o seu preparador, o Paulinho Ferreira, que mais tarde veio a ser o preparador do Speed 11 do Brum. Sobre isso, ele nos traz mais detalhes.

"Ele foi meu preparador, meu pai, meu amigo. Quando ele foi preparar o meu Speed 11 ele me disse: Brum, vou te ajudar e preparar teu carro, pois tinha muita pena de você, pois via teu sofrimento com aquele Fusca 77, completamente errado. Várias vezes te vi aqui na oficina sentado no carro do Guto sonhando.

Depois que parei de correr, todos os anos eu ia em sua casa no dia 31 de Dezembro dar um abraço e um beijo na única pessoa que me ajudou no automobilismo.
Sempre que voltava a sonhar em pilotar, pensava no meu "Velho", que era como eu o chamava, para preparar meu carro novamente. E eu sentia que seus olhos brilhavam quando eu falava em voltar a pilotar.

Nesse ano de 2010, no dia 31 de Dezembro encontrei sua oficina fechada. Pensei que ele estava na praia. Retornei dia 5 de Janeiro para cumprir meu ritual de todos os anos e dar meu abraço e meu beijo no meu pai no automobilismo. Uma vizinha me falou que ele faleceu em Setembro de 2010".

Fonte das imagens: arquivo Ayrton Brum.

10 comentários:

Roberto Lacombe disse...

Pô não sabia que o Paulinho Ferreira preparador do Guto morreu!
Esse cara me deu uma baita força no começo na 'Volkswagen 1600 Standard', sabia todos os atalhos...

Sabem quem é o cara do carro nº33 Roberto da Cunha Carneiro?
Eu.

CESAR CARDOSO45RACING disse...

BRUM!! A 30 anos passados ainda recórdo as noites sem dormir após também ter que vender o fusca que ganhou 12 horas na geral p/ usar a grana em uma casa!!!estou montando outro p/ brincar .Estas convidado a dar umas aceleradas comigo. cardoso.cesar45racing@gmail.com

Brum disse...

Lacombe....

Pra mim tambem foi uma surpresa. Depois que fechou a oficina na Aparicio Borges, ele montou nos fundos da casa dele na rua Bispo Wilians. Ali eu ia visita-lo quando tinha problemas no meu carro, mas o mais certo era todos dia 30 ou 31 de dezembro que eu passava para dar um abraço no veio.......e final do ano passado, ja não o encontrei....Sabia muito de fusca, competente, o carro sempre pronto 1 semana antes da corrida......saudade desse que foi um Pai para mim...

Brum disse...

Cardoso.

Será um prazer para mim te visitar te conhecer e para sentar em um carro de corrida, o prazer estará completo.......abraço

Francis Henrique Trennepohl disse...

Esse 11 tem história pra contar, e continua escrevendo a sua história, só que agora com o 2 na terra...
Abraços empoeirados

Anônimo disse...

me lembro que o brum ultrapassaou meu pai na ultima volta em taruma,se n me engano no laço, e tirou oq seria o primeiro trofeu dele.
queriamos a cabeça do meu pai, ele tranquilo achava que ja tinha terminado a prova.
euheuhuheuuue

Brum disse...

GRACIAS MEU AMIGO.

FOI EXATAMENTE ASSIM
EU VINHA TODO O FINAL DA CORRIDA
ATRAS DO CARRO DO SEU PAI, E NOTAVA
QUE NO LAÇO O CARRO DELE DESGARRAVA E SAIA DE FRENTE, E NAO ERA ERRO DELE, MAS SIM DE AJUSTE DE SUSPENÇÃO DIANTEIRA.
E PROCUREI ENTRAR JUNTINHO DELE NO LAÇO, E SE ELE DESGARRASSE NOVAMENTE EU TENTARIA POR DENTRO, E FOI COMO OCORREU.
AGORA QUE FIQUEI SABENDO QUE LUTAVAMOS PELO NOSSO PRIMEIRO TROFEU....

POR FAVOR, DE EM SEU PAI, UM GRANDE ABRAÇO DE SAUDADE, NÃO LEMBRO DELE, LEMBRO SOMENTE DO CARRO...

GRACIAS PELO COMENTARIO, SERVIU PRA ENRRIQUECER ESTE BLOG DO NOSSO AMIGO SANCO

Anônimo disse...

nos somos de santa maria, foi atraves do meu pai(marquetto) que o moacir figueira comecou a correr.

cara, o nosso praparador Iter dos Reis, ficou louco quando o pai chegou atras de vc.
ate foi engracado, detalhe q na epoca eu tinha apenas 9 anos, mas me lembro de muitas coisas.

Brum disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Brum disse...

AMIGO.

LEMBRO BEM DO CARRO DE SEU PAI, ERA BRANCO COM DETALHES EM VERMELHO E AMARELO,EU ACHO.

lEMBRO DO NOME MARCHETO SIM, TINHA O NUMERO 35, REALMENTE ERA DE SANTA MARIA E O PATROCINIO FALAVA EM ALGUMA COISA DE "ITALIA"

GOSTEI DE SABER QUE ESTAVAMOS DISPUTANDO O NOSSO PRIMEIRO TROFEU.

E MAIS UM DETALHE EM COMUM, MEU FILHO DE APROXIMADAMENTE 9 ANOS NA ÉPOCA, O DOMENESH BRUM, TAMBEM ME ACOMPANHAVA EM TODAS AS CORRIDAS, E TAMBEM ME COBRAVA MUITO RESULTADOS, E ME DIZIA QUANDO SAIAMOS DE CASA.

"PAI, VAMOS BUSCAR OUTRO TROFEU.?"

UM GRANDE ABRAÇO EM VC E SEU PAI....

GRATO