Hoje passo a palavra - ou seria melhor dizer "passo o teclado" - ao próprio "Janjão" Freire que, acreditem, se empolgou com essa história do Blog e decidiu relembrar de um tempo que, para ele, já andava meio esquecido num canto de sua memória. Ele me enviou um ótimo relato e uma bela imagem que são também as respostas à uma pergunta que tenho certeza, muita gente gostaria de fazer. Mas afinal, qual foi a sua corrida inesquecível? Acelera, "Janjão"!
"A última prova do Campeonato Brasileiro de Fiat de 1980, em Interlagos, debaixo da maior chuva, foi, talvez, a prova que me deu a maior satisfação entre todas que disputei. Os envolvimentos pré prova já eram bastante emocionais, o campeonato finalizava, o Paternostro liderava e eu, para conquistá-lo, precisava vencer e torcer para que o mesmo não se classificasse entre os nove primeiros colocados. Isto já era quase impossível pela qualidade deste piloto e se tornava ainda mais distante pelo fato da sua equipe, a Milano, alinhar praticamente uma “ esquadrilha “ de carros brancos oficiais e alguns agregados paulistas, naturalmente mais simpáticos aos representantes da casa do que a “esses gaúchos metidos“. Fui, então, para São Paulo pensando em me despedir em grande estilo, percebendo que alguns sinais estavam sendo dados de que a Jardim Itália iria encerrar por ali a sua gloriosa participação nos campeonatos Fiat.
Marcamos a pole position no sábado, com três carros da Milano logo atrás (Áttila, Pater e Coelho), dois cariocas (Telmo Maia e Murilo Pilotto) e mais dois agregados da Milano, Hélio Matheus e Ana Lucia Walker, que colocara tempo em um bando de barbados. No domingo alinhamos com o mesmo acerto do sábado, torcendo que a chuva não viesse. Esta decisão se mostrou um erro. Pater sumiu na frente e eu lutei ferozmente para me manter na pista, já que o meu carro, com a suspensão dura, estava quase inguiável. Por sorte o Áttila se enredou nas telas de proteção da curva do Sargento (quanto a este fato, um detalhe curioso: quando a chuva começou forte antes da largada, o alemão, como era o seu estilo, veio no nosso box fazer um pouco de pressão: “agora é que vamos ver quem é piloto ou não. Vocês sabem: a chuva separa as homens das crianças“). Confesso que ao passar por ele naquela curva e vê-lo, todo atrapalhado e molhado, tentando desenredar o seu carro, debaixo daquele toró, quase parei para dar uma gozada nele. Ali estava um “adulto” em maus lençóis, enquanto as “crianças” continuavam brincando debaixo da chuva ... Mas, a situação estava tão preta que mandava a prudência deixar a gozação para depois e torcer que a primeira bateria acabasse logo. Cheguei em terceiro a nove segundos do Pater, o que representava uma enormidade em termos de tempo.
No intervalo de uma bateria para outra resolvemos fazer uma mudança radical na suspensão: trocamos os amortecedores por outros bem moles, as quatro rodas, que tinham um descentramento diferente do que as que todo mundo usava, foram substituídas, e diminuímos a pressão dos pneus pela metade. Enquanto estávamos ali naquele afã, correndo contra o tempo para colocar o carro em condições para a segunda bateria, recebemos a visitinha agradável do Pater e demais pilotos da Milano que, no mesmo tom do Áttila, vieram questionar o “chapéu” que nós tínhamos levado na chuva. Não faltou dizer que na chuva os motores do Clóvis de Moraes e do Mario Rambo não tinham como nos ajudar. Na chuva era o piloto que fazia a diferença, blá, blá, blá, blá.
Saí para a segunda bateria com a moral muito baixa, mas a medida que ia fazendo a volta de alinhamento comecei a perceber que algo havia mudado: o carro estava grudado no chão, passava pelas grandes poças d'água como se estivesse no seco, nem parecia o mesmo da primeira bateria. Não era mais um Fiat, era um Galaxie! Cheguei no alinhamento com um sorriso no rosto. Quando o Clóvis e o Mário chegaram na linha da largada e perguntaram como estava o carro, eu lhes disse em alto e bom som: “vou ganhar a corrida, assistam!“. Não deu outra, enquanto os demais pilotos procuravam as partes externas da pista para fugir do acúmulo de água, eu passava por dentro das mesmas de pé embaixo e o carro nem mexia! Fui passando um a um, quando chegou na curva do Sol, só tinha o Pater na minha frente. Ele fez a curva pelo meio da pista, tentando aproveitar a parte mais seca da mesma e deixando a parte interna para mim, na expectativa que eu arriscasse e me desse mal. Meti por dentro, passei como se estivesse no seco e dei bye bye a ele (vejam na foto em anexo, o exato momento da ultrapassagem). Fui colocando mais de um segundo por volta nele, ele saiu do meu retrovisor, foi diminuindo de tamanho, curva a curva, até que eu não consegui mais vê-lo atrás de mim. Eu falava sozinho dentro do carro: “capricha, capricha, capricha “, “acelera, acelera, acelera “ , “a prova é tua“, “quem é criança?" “ACELERA !!!“. Foram 14 segundos que eu devolvi a ele, a prova estava ganha!
O prazer não acabou aí, valeu mais a nova visita deles ao nosso box e a pergunta que fizeram ao Clóvis: “o que tu fez com o carro do Janjão? Mágica? Conta!“. E o Clóvis: “tu sabes, na chuva o piloto...“ e encerrou com um sorrisinho maroto no rosto.
Perdi um campeonato cheio de incidentes e acidentes mas aquela faixa de campeão levou um carimbo gaúcho. Para sempre.
Um abraço,
Janjão
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6 comentários:
espetacular !!!
o Maurobala roubou minha palavra
Espetacular mesmo, grande piloto !!!!!
O piloto paulista Áttila João Sipos, também chamado por alguns de "o diabo loiro", detentor do prêmio "o macacão mais sujo do campeonato" era um sujeito muito polêmico devido às declarações que fazia, amado por uns, odiado por outros. A revista de automobilismo esportivo mais lida na época, a Autoesporte, cujo redator Marcus Zamponi (o Zampa) certa feita não gostou das declarações do Áttila, e nas edições seguintes os textos se referiam ao piloto somente como "...o piloto A.João...", muita gente não entendeu e nem sabia de quem se tratava, e na verdade era o Áttila João Sipos.
luiz borgmann
Bem lembrado Luiz! Inclusive nesta mesma enquete feita por uma revista, o Áttila também levou o troféu de capacete mais feio e esculachado. Era comparado a uma touca de cirurgião. Diziam que era melhor um coco amarrado na cabeça. O título do macacão foi mais por causa do cheiro do que pelo visual...
Que que é isso, minha gente...
Valeu, Luiz!
O Borgmann é respeitável. Faz uma análise fiel dos fatos. Já o Leandro Sanco, claramente, está com dor de cotovelo. Aí tem...
Fecha o armário, tchê!
Attila Sipos.
Attila Sipos? O próprio????? Cacilda!!!! Fala aí, tchê! Dor de cotovelo nada, só transcrevi o que disse a Quatro Rodas da época! Hahahaha.
Mas conta aí as tuas memoráveis brigas nas pistas com a gauchada.
Ilustre presença.
Grande abraço,
Sanco
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