quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Tava tudo dando errado, e de repente tudo deu certo....

Faz tempo que eu esperava por essa história, que ouvi pelo rádio, há muitos anos, contada pelo próprio protagonista, Carlos Alberto Petry.

Vai que é tua, Petry!

"O ano era 1976, eu corria com um Passat 1.500 cc com 78 HP, disputava o título gaúcho com o Fico Barros de Júlio de Castilhos, que corria com um Dodge Polara, de 1800 cc e 93 HP. Em todo o Brasil os Polara reinavam absolutos, aqui no RS as coisas eram diferentes, além de termos ganho várias corridas com os 1.500, a vantagem que os Polara tinham nas retas e retomadas eram compensadas pela maior estabilidade dos Passat, especialmente nas curvas de alta, assim como a um a dois e a nove de Tarumã. A penúltima etapa do Campeonato Gaúcho iria valer também pelo Campeonato Brasileiro, seriam as 12 Horas de Tarumã daquele ano.

Primeira surpresa, um ilustre General, Osiel de Almeida, resolveu reduzir as 12 Horas para 4. O motivo alegado era a economia de combustíveis derivados do petróleo. Assim pensado, assim feito em democrática canetada.

A Volkswagen havia feito uma alteração na taxa de compressão dos motores 1.500, de 7 por 1 para 7,4 por 1, introduzindo um novo pistão nestes motores. Com a participação e empenho da turma do Escritório Regional da VW conseguimos três jogos destes pistões diretamente da fábrica. O Ivan Hoerlle montou dois motores, um para o meu carro o 18 da Avanço HP, e outro para o carro 20 do Aiser Hehn.

Comigo correria o Paulinho Hoerlle e com o Aiser o Toninho Luft. Terça feira da semana da prova 18 horas, saímos eu e o Paulinho rumo à Floripa, com a finalidade de amaciar e avaliar a obra do Ivan. Fizemos POA/Floripa, ida e volta, duas vezes naquela noite/madrugada, e ao final da aventura de amaciar o motor (prática comum na época) estávamos cansados, mas satisfeitos, pois o motor prometia.

Quinta feira, treinos livres, sem novidades. Segunda surpresa, sexta feira chegam os paulistas, com uns poucos Polaras e um batalhão de Passats, todos TS o qual havia sido homologado naquela semana pela CBA. Dessa homologação, nós aqui no RS só tivemos notícias quando os TS paulistas chegaram a Tarumã. Para quem não sabe o Passat TS tinha 1.600 CC e 96 HP. Resultado das tomadas de tempo, estávamos nós e o carro do Aiser em 9º e 10º.

Saí do autódromo e da telefônica de Viamão liguei para casa de um amigo, que era proprietário do único TS que havia em Taquara, pedi o carro dele emprestado para tirar o motor e os “etceteras”, que o diferenciavam de um 1500 para colocar no meu carro. Loucura imaginada, loucura realizada.

Sábado, nove da matina estava eu encostando na oficina do Ivan na Edmundo Bastian, com um TS praticamente zero KM. Foi o tal de desmancha um e “mancha” outro que nem o diabo acredita. À noite chagamos a Tarumã, com um Passat TS. Por falar em diabo, o próprio resolveu dar as caras. Primeiro o meu carro apresentou um pequeno vazamento de óleo do câmbio, que resultava em fumaça, pois pingava sobre a descarga. Mandamos buscar na Gaúcha Car uma “rabeta” de caixa completa e montada. Esclareça-se que assim como a Carro do Povo, a Gaúcha Car, trabalhava em regime de 24 horas. Em seguida o motor do Aiser foi pro espaço, e nós, que fomos para Tarumã com dois carros, estávamos sem nenhum e a corrida não tinha sequer começado.

O Aiser, então foi até a oficina do Ivan e buscou o meu motor 1500 que sobrara, para montar no carro dele. Enquanto isto o Paulinho Hoerlle foi dando uma mãozinha pro Ivan e foi tirar o motor fundido do carro do Aiser. Ao soltar a mangueira inferior do radiador o diabo entrou em ação, a mangueira arrebentou e o Paulinho foi lavado, rosto e braços com água fervendo, foi um quadro muito feio. Atendido e medicado o Paulinho mais parecia uma múmia de macacão, restava a dúvida se ele poderia correr. Pelo sim e pelo não, conversando com outros pilotos ,entre os quais estava o Aroldo Bauermann, perguntei-lhe com quem ia correr e ele me disse que não ia. Chamei ele pra lado e disse: vai buscar teu macacão, capacete, luvas etc, e ele se mandou. Fui à torre e o inscrevi como piloto reserva. Falei isto só para o Ivan, pois a hora da largada estava chegando (03:00 da madrugada) e eu iria largar sem saber quem iria finalizar a prova.

Larguei em 9º. E com menos de 10 voltas, estava em segundo, onde tive uma disputa acirradíssima com um dos maiores pilotos brasileiros que eu conheci, o Atila Sippos, que durou aproximadamente duas horas, ora um ora outro levando vantagem, nós estávamos virando em 1’ 27”, foi então que o Atila foi pro box, para troca de piloto, abastecimento e troca dos pneus dianteiros. Três voltas depois entrei e então vi que quem ia me substituir era o Aroldo. Sai do carro e estava ajudando ele a colocar o cinto, quando ele me lascou a seguinte pergunta: onde se acende os faróis? Gente, o “carinha” não tinha guiado um Passat nem na rua, e o medo tomou conta. Em quatro voltas ele já virava abaixo de 1’29” dando a tranqüilidade que, eu acho por todo o esforço, nós merecíamos. E não deu outra, o Aroldo levou o “TS” até a bandeirada, sem qualquer percalço, e nós fomos os vencedores da primeira corrida de um Passat TS no Brasil.

Para finalizar, algumas considerações sobre a prova. Fosse o Paulinho Hoerlle e não o Aroldo, com certeza teríamos vencido da mesma forma. Mas o certo é que se não fosse o Ivan Hoerlle, nada teríamos conseguido. O Aiser e o Toninho Luft, com o meu motor de 1500 cc ficaram em quarto lugar. O motor do Aiser que fundiu não foi amaciado. Na troca de pilotos, ganhamos um substancial tempo, pois não trocamos os pneus dianteiros como foi feito no carro do Atila. Pelo Campeonato Gaúcho eu me sagrei campeão e o Aiser vice, sendo em 1976 o único título nacional não conquistado por um Dodge Polara e também foi o primeiro título conquistado pelo preparador Ivan Hoerlle. Finalmente o Aroldo Bauermann é um dos pilotos mais versáteis com quem eu convivi nas pistas. E ainda, o amigo que me emprestou o TS chama-se Rubem Behs. Comprei um TS zero direto da fábrica e entreguei a ele e fiquei com o “desmanchado”.

Não preciso dizer mais nada. Sensacional o relato, Petry! Muito obrigado por dividir conosco essa tua aventura.

Fonte da imagem: revista Quatro Rodas.

5 comentários:

luiz borgmann disse...

Havia uma foto de lançamento da equipe Avanço HP, onde apareciam os pilotos Petry e Hoerlle e os dois Passat 1500, acho que foi ainda na oficina antiga da Edmundo Bastian, mas quem ainda tiver essa foto poderia enviar pro blog. A propósito da matéria do Petry, é excelente pois é cheia de detalhes extra-pista. Vale lembrar que na rivalidade Dodge 1800 x Passat 1500, ambos receberam aperfeiçoamentos: o Dodge 1800 na versão Polara e os Passat na TS (este ultimo com aumento de cilindrada para 1600). Todavia, mercê de melhor conjunto, mesmo com menor cilindrada que os Polara, os TS se mostrariam superiores nas pistas. Como o Petry mencionou, Átila João Sipos junto com seu companheiro de pilotagem LUiz Otavio Paternostro (Castelo Branco Seguros) foram dos primeiros no Brasil a desenvolver um TS de ponta. Áttila, porém, já havia pilotado e conhecia bem um Dodge 1800 o qual havia pilotado no campeonato paulista do ano anterior, em que seu maior adversário com outro Dodge 1800 foi Fabio Sotto Mayor. Petry, manda mais fotos do DKW.
Um abraço,
luiz borgmann

Roberto Lacombe disse...

Sensacional, muito legal o relato, parabéns Petry!

Niltão Amaral disse...

Sou suspeito para falar, mas... FANTÁSTICO!

Estamos tentando reviver um pouco destas histórias (na medida do possível, claro) com a Fórmula Classic RS, na qual toco um humilde Passatinho. O relato é fantástico, nada como quem está lá dentro para fazê-lo com este nível de detalhamento.

Estou pedindo permissão, neste momento, para reproduzir esta matéria lá no Blog do Passatão! Posso? hehehe!

Abraço,
Niltão Amaral.
Blog do Passatão
http://blogdopassatao.blogspot.com

Claudio Ceregatti disse...

O que dizer, amigo Sanco?
nada. Só babar, sonhar e re-lembrar aventuras muito semelhantes a essa, cheia de (como sempre) amigos de plantão, diabo solto onde não deve, madrugadas, amaciamentos ilegais, muito sono, dores nas costas, prazeres dolorosos e, mesmo 34 anos depois, Lembranças tão nítidas como se ocorressem ontem.
Tempo que o cabelo era ainda preto, a barriga inexistia e todo o resto funcionava...
Bota mais desses, Sanco.
Essas histórias são o retrato da verdade, a cara dessa nossa estranha paixão.
Abraços aos heróis de mãos sujas.
Merecem, e pelos próximos 34 anos tambem.

Leandro Sanco disse...

Toca ficha, Niltão!