segunda-feira, 15 de março de 2010

Direto de Bagé - Curva 1

A volta das férias traz uma novidade: a exemplo do que ainda faz o Saloma em seu blog, abrindo o espaço para alguns blogueiros soltarem o verbo, convidei o amigo Henrique Mércio, ou simplesmente "Caranguejo", para dividir algum "causo" ou história com a turma. Essa receita não é nova na blogosfera e tem um expoente, vindo lá mesmo do "Blog do Saloma". O Joaquim, ou nosso querido "Mestre Joca", começou dando pitacos, depois passou a escrever uma coluna e hoje tem um dos melhores blogs sobre automobilismo histórico que conheço. O próprio "Caranguejo" já vem fazendo um trabalho muito bom com o Rui, lá do "Histórias que Vivemos", falando sobre Fórmula 1 da antiga. Aqui a coluna dele será denominada "Direto de Bagé".

Vamos curtir então essa volta de apresentação do Caranguejo aqui no bloguesinho, que hoje fala sobre o trágico acidente do Giovanni Salvatti no Tarumã. Lembro que os assuntos serão sempre relacionados com o tema principal do espaço, a história do automobilismo gaúcho.

"Curva 1 - por Henrique Mércio.

Inicialmente é preciso dizer que o ano de 1971 foi especialmente doloroso para o aficionado italiano. No curto espaço de dez meses, duas de suas grandes esperanças nas pistas, Ignazio Giunti e Giovanni Salvatti morreram nos Pampas: Giunti no Autódromo de Buenos Aires, durante uma etapa do Campeonato Mundial de Marcas, num bizarro acidente, que isoladamente mereceria um post. E nosso enfocado, Giovanni Salvatti, na pista de Tarumã no município de Viamão.


Salvatti foi campeão italiano de F3 com um Tecno em 1970, o que fazia antever que sua meta era atingir a F1, da mesma forma que muitos de seus contemporâneos como Emerson Fittipaldi, Niki Lauda, Carlos Reutemann ou Ronnie Peterson. Fez parte de uma leva de jovens pilotos que no começo dos anos setenta veio tentar a sorte nos torneios inter-temporadas das Fórmulas 3 e 2. Normalmente nessa época – inverno na Europa - muitas pistas ficam impraticáveis devido à neve, forçando algumas equipes a se aventurar em certames curtos de três-quatro provas na América do Sul, ou onde houvesse uma boa dotação. Tais provas eram iniciativas de empresários como Antonio Carlos Scavone, que organizava as corridas.

Salvatti esteve no sul duas vezes, correndo em Tarumã. No começo de 71, participou do Torneio Internacional de F3 com seu Tecno TF70 Ford/Novamotor. Não chegou a impressionar. Problemas de motor o alijaram da primeira bateria e impediram sua participação na segunda. Mas nas etapas em Interlagos obtivera um nono lugar, dois terceiros, um segundo e um primeiro lugar em seis baterias. Sua vitória inclusive foi a frente de Wilson Fittipaldi, o que não era pouca coisa. Fez pontos o suficiente para ser o vice-campeão do torneio, atrás de Wilsinho.

Após um participação discreta no Europeu de Fórmula 2 ao longo da temporada, Salvatti despachou seu March 712M/FVA da Scuderia Ala d`Oro para o Brasil. Vinha tentar a recuperação no Torneio Sul-americano de F2, que iniciaria com duas etapas em SP, prosseguiria com uma etapa em Tarumã e terminaria na Argentina. O início foi bom, com um sexto e um quarto lugares, mas depois só problemas. Em Tarumã, problemas com o câmbio o tiraram da disputa na primeira bateria mas na segunda, vinha disputando posição com Wilson Fittipaldi quando, à seis voltas do final, resolveu tentar surpreender Wilsinho na Curva 1. Retardou a freada e enfiou o March por dentro. Conseguiu passar, mas não conseguiu fazer a curva. Mesmo freando, não evitou a batida no guard-rail. Naqueles dias, a cerca de proteção era constituída de duas lâminas de metal. O March alojou-se no curto espaço entre elas, provocando sérios ferimentos na cabeça do piloto. Retirado, chegou a receber os primeiros socorros mas não resistiu.

Após a tragédia, tanto tempo depois, ainda é de se perguntar o que teria feito Giovanni arriscar-se tanto num ponto crucial da pista, por uma posição intermediária. Na época chegou a suspeitar-se que ele teria tido uma briga com sua namorada e pensara em suicídio. Realmente, a namorada estava tão serena depois da batida que chegou a dispensar o auxílio de um aluno de medicina que ofereceu-se para ajudá-la, como testemunhou o jornalista Ricardo Kotscho. Introspectivo, Salvatti recusou entrevista a uma jornalista que o procurou antes de sua última corrida, alegando que não era um bom entrevistado: “Não sou um sujeito feliz”, disse. Mas isso são só lembranças perdidas, de quase quarenta anos.

Não quero polemizar e sim homenagear o piloto audacioso que batiza a Curva mais desafiadora do autódromo onde correu pela última vez. Ele, que deixou a tranquila Castelamare d`Istabia, próxima de Nápoles, que só tinha 28 anos e veio encontrar seu destino, em uma terra tão distante da sua.

Henrique Mércio"





Henrique Mércio, também conhecido como "Caranguejo", reside na cidade de Bagé - RS e é um aficionado do automobilismo, colaborando com vários sites e blogs com sua memória privilegiada e seu farto material sobre o assunto.

Fonte das imagens: arquivo Rogério P.D. Luz (prova de Interlagos) e Paulo Torino.

5 comentários:

Rui Amaral Lemos Junior disse...

Muito bom Caranguejo! Parabens a vc e ao Sanco. Assisti de perto os dois torneios e quando veio a noticia da morte de Salvatti, fiquei um tanto triste, após aquele fatídico 1.000 KM de Buenos Aires em que Beltoise sem querer provocou aquele acidente terrivel, do novo Tarumã veio este outro acidente.
Vida longa ao "Direto de Bajé" e a vc Sanco.

Abs

Rui

Anônimo disse...

olha o velho Caranguejo se "espalhando" por aí.
parabéns, amigo, estas começando a ocupar o espaço que mereces.
fico feliz por você
só espero não perder pra concorrencia, hahaha

revdo.

Anônimo disse...

Só gostaria de destacar que sem as imagens do Rogerio Da Luz, não seria possível a obtenção do resultado final. A ele o meu muito obrigado.
Caranguejo

Paulo Schütz disse...

Relato preciso daqueles dias, excelente!
Parabéns pela inciativa, ao Leandro e ao Caranguejo.
Abaços.

Maneco Marques disse...

Naquele torneio trabalhei como fiscal de pista,e O Giovanni Salvati entrou em baixo do guard rail,que deveria estar um pouco alto em relação ao piso.O bico do carro é que fez o papel de alavanca,que infelizmente terminou matando o Piloto.Portanto a batida não foi entre as 2 laminas e sim na de baixo,pelo menos é o que me lembro.
Um abraço
Maneco Marques