sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Embrulha esse para levar, por favor.

Entrar e sair do Fitti-Vê foi um exercício de contorcionismo. Cockpit estreito, tive de cuidar para não bater em nada. Já pensaram quebrar alguma coisa naquela relíquia? O carro foi construído em 1966 e pilotado pelo Emerson no ano seguinte. Estava diante do único exemplar ainda vivo do Fitti-Vê. Passei a conhecer e acompanhar mais sobre esse carro e a categoria no site do Mário Estivalet, um expert no assunto, aqui de São Leopoldo. Quando se percebe as formas da barata, os equipamentos utilizados para sua construção, uma certa revolta vem à mente: por que não temos mais uma categoria escola no país? Uma rápida pesquisa dias depois no www e vejo várias categorias de FVê ainda em atividade pelo mundo. Será que um dia teremos novamente uma categoria assim? Um passarinho me contou e acho que teremos sim. O que vocês sabem sobre isso Cerega, Zullino, Lucca, etc?

Pergunto pro Paulo onde está o cinto e ele diz que não tem (!). Uma rápida arranhada na primeira, solto a embreagem rápido para não forçá-la, giro alto e lá vamos nós de novo. Câmbio suave, suspensão e motor idem. Uma belezinha. É claro que a carga emocional é menor, afinal o batismo já tinha acontecido antes e também eu conhecia pouco sobre os Fórmula Vê, ao contrário de uma dezena de experts que passaram o dia falando e andando naquele carrinho. Mesmo assim, aproveito o momento raro, que acaba passando rápido. O Paulo disse para não deixar o motor morrer na entrada do box, chego acelerando para manter o giro alto. Vejo o Tio Zullino com seu capacete vintage e óculos especiais - para enxergar os instrumentos, como disse o Vicente - já pronto para entrar e acelerar. Rápida troca de "pilotos" (na verdade o Zullino pilota mesmo, na Classic em SP), e o Fitti-Vê estava novamente em ação. E o Paulo sempre dizendo "VAI, VAI, VAI!!!"




Um breve descanso. Se o dia terminasse ali eu já estava mais do que satisfeito. A movimentação era intensa. Aquilo parecia festa de confraternização da turma que fez um bolão e acertou na mega sena - se é que isso existe, claro. Mas acho que mesmo na turma da mega, deve haver muita inveja, discórdia, pois sempre tem um que apostou uma grana a mais que o outro, a ganância aflora, dane-se a amizade. O que vimos em Guaporé foi um grande companheirismo. Todos faziam questão de ajudar os demais naquilo que pudessem. Parou um carro, o novo piloto é mais "gordinho"? Já tinham uns três sobre a barata para ajustar o cinto, regular espelhos, alcançar equipamentos de segurança, enquanto os outros iam fazendo fotos e eternizando aqueles simples mortais entrando e saindo maravilhados daqueles carros que mantém viva a história do automobilismo do Brasil de antigamente. Encontrei outros amigos, o Mosquetta, o Erlon e o Arlindo e Luciano Marx. Fui dividir a minha alegria com eles. Os Marx levaram o Escort a convite do Paulo e deram algumas voltas por lá. O Mosquetta estava filmando para o programa do Speed Channel que irá ao ar em breve. O Erlon acabou fazendo fotos bem legais.

Entrou o Fórmula Fiat, carro que me deixou muito feliz ao vê-lo no caminhão em Passo Fundo. Dias antes do evento, o Paulo mandou uma lista com as baratas que estariam à disposição e esta não figurava entre elas. A felicidade se explica: o primeiro ano da Fórmula Fiat no Brasil foi em 1981, quando a VW tirou o patrocínio das categorias de monopostos e dos Passats. A Fiat, que fazia um baita sucesso nas pistas - com a pancadaria entre os 147s - decidiu apoiar os monopostos e assim, os chassis que estavam parados receberam a motorização italiana. Eu lembro dessas provas e o Kaimann, chassi que estava lá em Guaporé, era o meu preferido, por suas linhas agressivas. O chassi de propriedade do Paulo é um 1974 em perfeito estado de conservação. Entro no carro e a posição é super confortável. Muito espaço lateral e para os pés, que inclui ainda um descanso para o esquerdo. Quando me dou conta o Ceregatti está fazendo várias fotos desse momento. Ele percebe a minha alegria. O Ceregatti estava em alfa, era sem dúvida o mais brincalhão entre todos. Estar junto dessa turma foi incrível.




O motor não pega. O Marcos faz de tudo. Cara esforçado, competente, atencioso com todos. Bom vê-lo a mil de novo. Descobri que ele acompanha o Paulo há 18 anos, desde o tempo em que o Paulo corria no Gaúcho de Fórmula Ford. Eram oito carros precisando de atenção quase que o tempo todo e era raro algum ficar estacionado por muito tempo. Tentamos mais uma vez, o motor roncou alto para não apagar mais. A posição de guiar é ótima. A melhor até então. Poderia ficar horas ali curtindo. Uma esticada forte na saída do box (piloto de box, como disse o Mosquetta) e já noto a dianteira meio solta. Não é tão estável quando o JQ Reynard, mas o câmbio é melhor. Mesmo assim, é possível acelerar bastante e se divertir de novo. Mais algumas voltas, o motor meio embrulhado, mas na entrada da reta ele vem cheio, uma delícia. Nas reduções o motor pipoca. Como é legal ouvir isso de dentro do carro. Já me perdi nas voltas. Não tem ninguém na mureta acenando, acho que é a última. Vou devagar, aproveitando cada segundo. Se desse, eu levava esse pra casa.


Em breve a experiência na última barata.

Fonte das imagens: João César, arquivo pessoal (Valeu, Comendador!) e Erlon Radl.

5 comentários:

Claudio Ceregatti disse...

Leandro...
Ocupado como sempre em registrar a história do automobilismo no sul, talvez voce nunca tenha reparado que, além de abnegado historiador e blogueiro de primeira - tu és um excepcional cronista.
Sempre escrevendo "sobre os outros ou algo de outros", o Engenheiro de Bajas e Palavras estava meio escondido. Pois agora apareceu!
Não vi teu depoimento ao Speed Channel, mas pelo que me disseram, foi apaixonado e aplaudido.
Tudo isso junto, além de ser um cara do Bem e da Luz, encantou a todos.
parabéns por voce ser assim, camarada Sanco.
E vamos incendiar essa blogosfera e outras esferas de histórias. O mundo inteiro precisa saber que Brasil é esse, localizado fora do eixo Rio-São Paulo e que é a República do Rio Grande desde sempre...
Continua, camarada.
Não economize as palavras. Quem te lê está adorando, não tenha dúvida nenhuma disso.

Francis Henrique Trennepohl disse...

Eu me dou a liberdade de responder a tua pergunta, Leandro: TEREMOS SIM!
As pessoas envolvidas no projeto da nova F-Vê (ou "Vee") estão fazendo tudo com cérebro e tesão, não entrando na jogada interesses financeiros, o que já é mais de 90% pro sucesso.
Se Deus quiser vou correr nessa categoria, mesmo com o risco do vexame de ficar entalado no carro.
Essas pessoas merecem toda nossa consideração, respeito e admiração pela iniciativa e trabalho árduo que estão desenvolvendo.
Sem contar as figuras que estão nos bastidores, aí vira um "dream team".
Assino embaixo do comentário do Cerega.
Pisa fundo nos textos, Leandro!!!

roberto zullino disse...

A turma da área técnica fez um projeto muito bem pensado, a ergonomia do carro será a melhor possível. Não acredito que alguém fique entalado, nem o Cerega.
Não corro mais na classic, regulei meu carro para a rua e ando com ele normalmente aterrorizando as famílias granjeiras na rodovia raposo tavares.
Minha última corrida foi em 2003 e já estou enferrujado, mas me entusiasmei nessa viajem a PF e Guaporé e estou com vontade de fazer algumas corridas em 2010, só para brincar, meu carro não é mais competitivo na classic e não vou enfiar mais um caminhão de grana para isso. Vou esperar a nova categoria para gastar em brinquedo novo.
Abs,

regi nat rock disse...

Hmmm interessante.
Pra vc esse tem a frente frouxa, Pra mim, agarra pra valer e eu não estava desfilando não. Adorei seu depoimento. Quando crescer pode pleitear uma vaga de escritor na ABL. Talento não lhe falta.
Sugiro um título.
" Crônicas de um sonho concreto".
Tudo a ver né?

abração guri.

jcesar disse...

Só temos que parabenizar o jovem Sanco pelo maravilhoso trabalho de resgate da memória do automobilismo gaúcho. Automobilismo histórico, ganhador de 1000 milhas brasileiras, pioneiro na preparação de DKW (viva a familia Iwers), com Simcas 'apurados', ignorando no centro do Brasil, 'estamos longe demais das capitais', cantava os Eng. do Hawaii nos anos 80, esquecido no RS. Sorte a nossa que surgiu o Sanco, auxiliando o Trevisan na preservação e resgate da história do automobilismo. Abraço